Nos jornais, a palavra se destaca: transição. Como se, por passe de mágica, se passasse de um estágio a outro, entre os quais um interregno, a tal transição, servisse de ponto de virada, a novidade desde o início assegurada como se por estatuto. Depois de lá, já não se é mais o que se era.
Eis o milagre da transição, fazer crer que o novo se extrai do velho por obra do mero escoamento do tempo. Tudo bem, as pessoas estão lá, entretendo-se com os afazeres e se havendo com as dificuldades do mundo. Mas, antes mesmo que chegassem, ainda com o terreno vazio, já se chamava de transição a esse intervalo desabitado sobre o qual havia potência e expectativa, e mais nada.
Supõe-se que seja assim sempre porque sempre foi assim. E, do mesmo modo como se espera que entre um ano e outro algo se processe, e se instaure uma transformação na qualidade da vida e das pessoas, de uma transição também se espera o mesmo.
Ou seja, que seja por si o ingresso para esse outro mundo, um passe-livre para além deste agora que é incômodo.
Transição é a mudança progressiva, uma lenta alteração posta em marcha por forças cuja natureza a gente não conhece bem, mas nas quais resolvemos, por necessidade, confiar.
Veja-se o momento, a transição à luz do dia, politizada e empregada a propósito de tudo. Os nomes que a integram, os ritos que cercam a formação de colegiados de notáveis convocados a contribuir com esse novo estado de coisas.
Recebe-se a missão ciente de que o trabalho é imenso e de seu sucesso não existe qualquer garantia.
Há esperança, não resta dúvida, e mais uma vez o sentido da transição parece estar contido na própria palavra, na sugestão de movimento.
Afinal, transitar já é melhor do que habitar esse presente-passado do Brasil que ameaçava enterrar a todos num poço sem fundo. É disso que a transição nos salva, de que nos afasta, ainda que o caminho seja desconhecido.
Não se sabe aonde se vai quando se entra numa transição, os pontos de saída e de chegada como se escolhidos ao acaso, arbitrários como qualquer nome que se dê a qualquer coisa, gente ou objeto.
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