Jamais supus que a janela do avião fosse esse triângulo das bermudas da moralidade nacional, o lugar onde se perdem os referenciais e os códigos de civilidade se dissolvem entre bifurcações e outros dualismos. Afinal, ceder ou não o assento tornou-se questão que mobiliza a audiência a tal ponto que tudo o mais – da violência policial ao fracasso do time do coração – é apenas nota de rodapé ante a enormidade abismal do impasse que se coloca. Você trocaria de lugar com a criança cujos apelos audíveis fariam qualquer um de coração mole assentir de pronto, sem auscultar os batimentos de suas próprias lições de formação, ignorando o impulso de ficar apenas para sentir o prazer de contrariar esse pequeno Godzilla? Posta assim, talvez a questão acabe por perder complexidade, reduzindo-se a mera polarização. Mas é preciso ir além. Primeiro, convém entender o que significa um aeroporto para a classe média brasileira. Melhor: o que significa estar no avião ocupando uma cadeira pela qual se pagou...
HENRIQUE ARAÚJO (https://tinyletter.com/Oskarsays)