Jamais havia parado cinco minutos pra observar atentamente o ecossistema de um karaokê. O movimento das pessoas, o empenho que dedicam a cada interpretação, a seriedade estampada nos rostos, os pedidos de socorro às mesas vizinhas nas partes que requerem um gogó aprumado, a predileção por um cânone com mais apelo popular, a satisfação em se diferenciar cantando à capela alguma música obscura de um intérprete romeno naturalizado italiano, a sequência de hits que um mesmo cantor vai emplacando por rodada, o profissionalismo do garçom que segue anotando pedidos e enfileirando números num caderninho pautado ainda quando tudo a sua volta parece desmoronar, o clima de ritual que paira sobre todos. Num karaokê, ninguém se envergonha de mostrar sua verdadeira natureza (ou, quando se envergonha, já é tarde demais): o repertório de novela, o brega francês, todas as maravilhas da Década Romântica Explosiva, os sucessos de Patrícia Marx, Chitãozinho & Xororó, Raimundos e Furacão 2000
HENRIQUE ARAÚJO (https://tinyletter.com/Oskarsays)