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Mostrando postagens de janeiro 31, 2013

Grávida no caixa

Outra experiência entre não exatamente tantas possíveis, entre as possíveis que elegemos, as que displicentemente elegemos, aceitas como as únicas ao alcance, outra, portanto, é: andando a esmo no supermercado, parar de súbito e reparar na música e na textura das bananas orgânicas e nas uvas vistosas sem sementes enquanto, no último caixa da esquerda, na baia destinada a idosos e gestantes, uma linda menina avança implacável e doce com café solúvel, biscoitos e uma caixa de suco de maracujá, ela ri, ela acena, ela abre a bolsa e dela retira não um nem dois, mas três cartões de crédito, que dançam entre os dedos como fadas nos galhos da árvore mágica do Peter Pan, então a atendente faz o de praxe, executa os comandos de sempre, sorri, puxa com um golpe certeiro a nota fiscal, empacota as comprinhas miúdas da menina grávida, são apenas duas sacolas, diz em tom maternal “lá fora está chovendo”, pede que passe antes no fiscal para retirar a trava ou algo do tipo afixada à blusa e em segui

Blocos de rosa claro

Uma experiência entre tantas possíveis é: desprovido de qualquer ferramenta digital, requisito que pode ser dispensado, visitar o bairro da infância e constatar que, passados 20 anos, os terrenos onde havia cajueiros e mangueiras e pés de azeitona, além de bananeiras, goiabeiras e ateiras, agora são condomínios com muitos blocos pintados de branco e um rosa clarinho, garagens com muitos carros, Celta e Peugeot e Siena e Polo, por exemplo, que são os modelos mais procurados por um segmento da classe recém-ascendente, e que ao lado desses condomínios as casas mais antigas continuam antigas, do mesmo modo que as ruas asfaltadas permanecem as mesmas, o que mudou basicamente foram os espaços vazios, antes campos de futebol, agora conjuntos de apartamentos, lagos foram aterrados, mas ainda há o córrego, a passagem molhada, a casa da macumba, a da primeira garota, a da segunda garota, a da prima do amigo etc. E logo ali, virando a esquina, no exato local onde, acossado por um grupo irasc

Impossível

Tinha um sonho estranho pra contar, mas acontece que esqueci e agora não resta nada além do básico do dia, que pode ser resumido ao trajeto casa-trabalho-casa, com passagem absolutamente banal em frente a uma farmácia, posto de gasolina que serve de ponto de encontro da velha guarda da Lauro Maia nos fins de semana, outra farmácia, locadora, lanchonete do tipo monte o próprio pedido (péssima ideia), Dr. Resolve, Central Park (há outro sendo construído dentro do mangue, também uma péssima ideia), um restaurante cuja especialidade é carne, outro cuja especialidade é massa, uma banca de revistas cuja especialidade são revistas para adultos, uma loja que vende pacotes de viagens, outra dedicada a roupas de criança e uma terceira cuja vitrine é povoada por manequins que mudam de vestido a cada duas horas ou um pouco mais que isso. Há um mundo imenso escondido em cada um desses lugares, mas acontece que passando na calçada, da perspectiva de fora, é impossível descobrir.