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Mostrando postagens de maio 1, 2016

Superfície

Sentia esse formigamento como uma sensibilidade fora de tempo, atrasada, um acúmulo de outras épocas que só agora chegasse ao corpo, uma carta atrasada enviada por alguém que não via desde muito, uma pedra atirada que apenas hoje afundasse no lago, um aceno que havia permanecido suspenso enquanto ela se afastava, avançando pelos corredores e portas e janelas. Era essa a sensação esquisita de algo que vinha, sim, mas depois de tanta demora que já não tinha sentido, perdera-se nos dias, entre sustos e outras reações do corpo, entre feridas e lacerações de carne. Achava que fosse efeito do remédio que vinha tomando, pílulas para dormir, mas depois lembrou que tinha interrompido a medicação e depois disso nada foi como antes. Achava que fosse o vento, mas fazia calor, e lá fora a copa das árvores não se movia. Acreditou que se tratava de presença extracorpórea, uma entidade ou categoria similar, que não dominava esse vocabulário esotérico ou religioso. Um sopro de além

Tudo implica tudo

Era a frase solta, uma epígrafe, talvez. Nem lembro. Como um luminoso de táxi, ficou grudado, guiando as rotas, acendendo a cada esquina, orientando pedestres perdidos no roteiro que inventaram para si.  Penso nesse tudo que leva de roldão o restante, outro tudo, que nunca é suficiente, apenas a parte que conseguimos juntar e carregar com as próprias mãos, o que podemos suportar. O peso que cabe. O tudo que cabe é pouco.