Cearense não entende lockdown, e não é porque se trata de palavra inglesa, porque no estado temos a maior concentração de falantes do idioma fora dos EUA e da Inglaterra. Fica em Sobral, a poucos quilômetros da capital, terra de gente escolada onde todo mundo já nasce dotado de um repertório lexical de estudante do último semestre da Casa de Cultura Britânica. Molecagem à parte, as dificuldades com o termo não vêm de sua origem estrangeira, tampouco da prosódia tortuosa, que faz a língua do gentio se dobrar numa ginástica exaustiva. O problema está no DNA do nativo mesmo, avesso a qualquer ideia de confinamento, clausura, de tempestiva vedação de um fluxo, de proibição irrecorrível. Um caráter que rejeita essas noções de "não pode", "não faça", "não vá" – há sempre quem acha que pode, que faz e que vai, mesmo no pior momento de uma doença desgraçada. Cearense entende que lockdown é um jeito de parar tudo, menos a conversa na calçada. Sabe que é medida extr
HENRIQUE ARAÚJO (https://tinyletter.com/Oskarsays)