Logo descarto o texto que escrevi na varanda, para onde mudei porque o quarto já estava excessivamente quente. É fim de tarde, quase noite, e ao longe ainda posso ver pinceladas de um laranja claro, um rosa muito fraco que aparece como estrias em meio ao azul forte do dia nublado. É imprestável. O texto, não a varanda ou o entardecer. Tem uma qualidade, porém: é a primeira coisa alegre em dias. Talvez por isso não tenha gostado. Uma certa vulgaridade no contentamento, o travo de um pensamento que se satisfaz consigo, a falta de jeito de uma ideia que se esboça tendo como fio condutor um gracejo. Nada disso me interessa, e, no entanto, foi o que passei as últimas horas escrevendo, sentado numa cadeira de ferro, de costas para uma parede na qual há dois quadros, a camisa aberta como um desses turistas que caminham no calçadão queimados de sol e a quem lhe oferecem passeios pelas praias cearenses. É uma de minhas fantasias. Travestir-me de estrangeiro, estar alheio na própria ci
HENRIQUE ARAÚJO (https://tinyletter.com/Oskarsays)