Conheci R há poucos dias. Ela me mostrou uma foto na qual a mãe lê o jornal com o corpo inclinado, voltado pra frente, segurando uma lupa com que aproximava a vista das letras. O papel cede diante dos olhos, dobrado. É uma imagem bonita pela qual sempre agradecerei. Pensei na minha própria velhice. Onde estarei, como, com quem. Se vivo ou morto. Se consciente ou falho, se ainda disposto e mesmo interessado no mundo, se muito amargo ou apenas um pouco. R disse que a mãe se prende ao agora, que acompanhar o noticiário é seu modo de não esquecer, e nisso também há tanta beleza. Um fio que se estende ao instante. Ela, que mora de frente ao mar e acorda todos os dias para uma imensidão aquosa, escolhe o jornal por janela, o presente como paisagem, o cotidiano como escapismo. Isso também me fez pensar em mim. Precisamente, no quanto há de fuga quando imaginamos mergulhar na realidade, quando supomos que escolher as horas do dia e cumprir certos ritos e tarefas é aceitar a con
HENRIQUE ARAÚJO (https://tinyletter.com/Oskarsays)