Tenho experimentado escrever para dominar momentaneamente o sentimento do medo. Funciona, e não preciso recorrer a outros expedientes, sejam remédios, filmes, apelos, orações, bebidas, sono, psicanálise etc. É simples: convívio. Escrever é coabitar, estar perto, sentir-se dentro, pertencer. Em alguma medida, também quer dizer desafiar, encarar, cuspir na cara. Finalmente, escrever é resignar-se. Todos os sentidos estão reunidos aqui, agora. Menos por vontade própria que por alguma inevitabilidade presente em qualquer coisa viva. Não escolhi nada, o que veio, veio e pronto. O medo está aqui, não posso fazer nada, exceto identificar o medo, cercar o medo, olhar sério para o medo, simulando expressão de enfado e, em caso de ineficácia, inequívoco desgosto, até finalmente atingir aquele estágio de desespero em que sorrimos descarados para o medo. Cercado por zumbis, sozinho no corredor, três balas no pente e sem chances de fuga. Medo. Pânico. Desespero. Graça. Ninguém além de mim mor
HENRIQUE ARAÚJO (https://tinyletter.com/Oskarsays)