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Mostrando postagens de janeiro 22, 2019

Teatro do choro

Há algo de artificioso no choro do Flávio – permito-me agora alguma intimidade com o personagem, não a figura real, mas aquela que aparece no vídeo de curta duração cujas palavras interessam menos que a performance em si. Quando o vi pela primeira vez após dias evitando qualquer assunto que se relacionasse a política, reconheci aqueles gestos. O esgar, as contrações do rosto, o lábio se comprimindo, a progressiva careta em que se converte e, dentro da boca, uma massa invisível macerada insistentemente, um conteúdo indigesto – todos esses sinais indicavam um rito familiar. Era o choro da negação involuntária, e eu o conheço muito bem porque recorri a ele muitas vezes durante esses anos todos em que precisei dizer algo enquanto o meu corpo falava o contrário, cada uma dessas porções ignorando o que a outra fazia e dizia.   Então me pus a escrever, sempre sob a pressão do tempo, convencido de que havia algo ali sobre o qual talvez valesse a pena falar qualquer coisa. E esse

As lágrimas de um homem

Flávio Bolsonaro morde o lábio inferior e desvia o olhar, como se um cachorro houvesse mordiscado a ponta do seu pé e agora ele precisasse lhe dar atenção num momento delicado da performance, o clímax da atuação. Sentado no sofá diante de uma câmera parada, funga novamente. Em seguida volta a mastigar – um chiclete imaginário, a bochecha ou a própria língua? Não se sabe. Quando volta a encarar a lente, a primeira desde a última entrevista à TV Record, está prestes a se debulhar, mal contendo o jorro lacrimal que se anuncia. Afinal, são meses de tensão acumulada, acusações as mais diversas que o punham numa situação desconfortável diante da qual, como a maioria dos homens, só havia algo a fazer: chorar. E foi o que fez. Na terceira tentativa da manhã, finalmente tinha acertado, caprichando nas caras e bocas. Sem carregar no drama, e amparado num elemento que o conectava diretamente com as massas (uma bandeira do Brasil), marejou os olhos gateados de um verde quase transparente