Pular para o conteúdo principal

Postagens

Mostrando postagens de março 11, 2013

Apenas uma vaga ideia

Aceitei o desafio e tentei imaginar uma música sem fim, uma música cujas partes se sucedessem de tal maneira que não fosse possível afirmar quando terminam nem acabam, espiraladas em uma sequência de sonoridades agradavelmente indistintas, que, somadas, produziriam uma sensação de conforto, de incômodo, alegria e tristeza, culpa e misericórdia, uma sensação também dilatada, esticada como ficam esticadas em ângulo raso as redes de armar precariamente atadas de uma parede a outra sem o auxílio de cordas ou correntes. Era com isso que parecia a música, superfície plana de tecido cru limitada em todas as direções por uma noção fantasmagórica de que o tempo passa devagar, o tempo conta a nosso favor se de repente o enganamos? Rede aberta que não se curva sob peso algum? Um pula-pula para adultos? Consulte a memória. Gostava de imaginar o tempo assim: infantil e ingênuo, não esse senhor empedernido e solene proprietário de todas as respostas. Gostava de imaginá-lo um tolo a quem q

Avança

Então estava lá no espigão da João Cordeiro, um braço de concreto sob forma de ponte que avança muitos metros mar adentro, não sei agora a real extensão, poderia consultar no Google, mas seria uma perda de tempo, de modo que prefiro me perguntar se se trata realmente de ponte ou se existe outra denominação que não seja a vaga “espigão”, que, embora simpática, diz pouco da condição do artefato de engenharia que, partindo da areia firme, lança-se em direção à água e, num dado momento dessa trajetória guiada sabe-se lá por quais motivações, se pessoais ou estritamente profissionais ou ambas, resolve parar, não uma pausa suspensa, aberta a retomadas e desvios, mas um fim calcado em pedras que têm a suprema habilidade de defender o espigão das ondas que se esbatem com fúria. Pergunto também se a hora de parar é sabida de antemão ou se chega o instante em que, tendo avançado bastante, olhando pra trás com um sentimento que é a mistura de orgulho e medo, orgulho da distância vencida, med

Aniversário

Enquanto caminhava entre pratinhos de comida revirados e embalagens de presentes, fazia um esforço tremendo para lembrar que, se me sentisse genuinamente pouco à vontade ali, talvez algo ocorresse, algo que valesse a pena, não uma típica manifestação da experiência redentora nem um caso que depois seria arquivado nas gavetas das realizações que é melhor não repetir. Então foi o que fiz, até onde pude tornei a experiência constrangedora, fiquei mudo, bati com a testa no tampo da mesinha de centro inúmeras vezes, chequei o telefone, mastiguei a ponta dos dedos, cruzei e descruzei as pernas, lambuzei a bochecha com chocolate, realizei testes com a chama das velas que queimavam por perto, enfim, a cada nanossegundo emitia sinais inequívocos de que estar naquele lugar com aquelas pessoas naquelas circunstâncias tinha uma razão que não se confundia em nenhum momento com a vontade deliberada, com a minha vontade, para ser exato, e isso de algum modo significava um tipo de incômodo qu