Enquanto caminhava entre pratinhos de
comida revirados e embalagens de presentes, fazia um esforço tremendo para
lembrar que, se me sentisse genuinamente pouco à vontade ali, talvez algo ocorresse,
algo que valesse a pena, não uma típica manifestação da experiência redentora
nem um caso que depois seria arquivado nas gavetas das realizações que é melhor
não repetir.
Então foi o que fiz, até onde pude tornei a experiência constrangedora, fiquei mudo, bati com a testa no tampo da mesinha de centro inúmeras vezes, chequei o telefone, mastiguei a ponta dos dedos, cruzei e descruzei as pernas, lambuzei a bochecha com chocolate, realizei testes com a chama das velas que queimavam por perto, enfim, a cada nanossegundo emitia sinais inequívocos de que estar naquele lugar com aquelas pessoas naquelas circunstâncias tinha uma razão que não se confundia em nenhum momento com a vontade deliberada, com a minha vontade, para ser exato, e isso de algum modo significava um tipo de incômodo que deveria não apenas ser visível, mas incomodar os demais em medidas e graus variáveis.
Por algum motivo, não era visível nem incomodava.
Ou era visível e isso não fazia diferença, ou era e produzia abalos sísmicos de
impacto apenas superficial - insuficiente, portanto, para que todas as pessoas agrupadas
em torno de mesas de plástico e garrafas de cerveja conversando animadamente (a
conversa orbitava assuntos que na época entendia pertencerem a um universo tão
distante que demoraria três vidas até conseguir me aproximar deles) parassem um
momento sequer e olhassem em volta com atenção e, algumas mais surpresas, outras
menos, matassem finalmente a charada que era tudo aquilo acontecendo ao mesmo
tempo.
E assim foi meu aniversário de nove anos.