Eu tinha a pretensão de escrever sobre o papel dos olhos no meio dessa pandemia, mas isso foi antes de descobrir que o Verissimo já havia feito isso, e feito ao modo do Verissimo, o que significa dizer que eu posso até tentar, desde que esteja certo de que fracassarei. É esse fracasso antecipado que me conforta e dá segurança para continuar. Mas, agora que comecei, vejo que não foi uma boa ideia. Porque, uma vez que a palavra instaura a imagem, e o texto do Verissimo faz isso, é impossível dissociá-la dessa ideia de que pertence a alguém. É como querer se livrar de um cheiro marcante. Simplesmente não dá. Com essa história dos olhos é a mesma coisa. Um dia, estava no supermercado parado. Olhava a caixa, que me olhava de volta. Ambos esperávamos por algo que não sabíamos o que era. Nesse ponto eu me afastei e levantei a máscara, pronunciando rapidamente as palavras, quase como um delinquente que anuncia um assalto: como eu posso ajudar? Ela aguardava que eu dissesse apenas se era débito
HENRIQUE ARAÚJO (https://tinyletter.com/Oskarsays)