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Mostrando postagens de agosto 28, 2020

Uma imagem

  Às vezes é apenas uma imagem, noutras uma sucessão de quadros. O cômodo desarrumado, a mulher apenas de sutiã com o rosto contorcido, o homem sobre o seu corpo miúdo, a cama desfeita, os gritos. O que fazia ali? Eu não lembro. Tinha cinco anos, talvez seis. Passara a tarde na casa da vizinha quando o marido chegara e a vira comigo. Encheu-se de fúria, bateu na mulher, ou julgo ter batido, não posso ter certeza. Não porque eu estivesse lá, por outro motivo – qual? Fiquei encolhido no canto à espera do desfecho, mas posso também ter saído antes, enquanto discutiam e a mulher lhe atirava objetos ao alcance da mão. Cigarro, sapato, um vidro de perfume que se espatifou contra a parede e deixou a casa com esse cheiro por muito tempo e que agora subitamente recordo, sem entender por quê.

Velho normal

  Ouvi de uma amiga que tinha saudades do “velho normal”, expressão não aspeada e portanto destituída de qualquer traço de ironia que usava para se referir a esse tempo que hoje parece deslocado. O lugar de antes, um jurássico passado onde éramos outros, outras as demandas e outro o compromisso. O velho subitamente convertido em fator positivo, uma qualidade de que agora sentia falta ante o novo “novo” que, de novo, não tinha nada novo, apenas farsa ou falsificação. Bom, eu lhe disse, talvez tenhamos de considerar a hipótese não de um velho, tampouco do novo, mas de um normal “normal”, acomodando-se aos poucos, uma realidade (detesto a palavra) que se impunha pelo que é, embora não soubéssemos de fato o que nos aguardava, se um mundo refeito depois da doença ou apenas repetição do antigo, sempre mais forte, sempre presente, sempre a força que se arrasta e chega a essa outra margem. De todo modo, eu lhe falei, não tenho saudade, apenas a leve sensação de que vivi durante todos esses mes