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Mostrando postagens de julho 8, 2021

Hotel

  Amanhã uma viagem curta, um refúgio por poucos dias. Acordamos cedo, arrumamos as malas e partimos. Asseguro-me de levar sempre o de que preciso, refaço as contas, repasso as palavras que pretendo dizer e as frases que talvez anote. Como sempre, levarei livros que ficarão de lado na maior parte do tempo, seja por desinteresse, seja porque nessas viagens a leitura, uma modalidade habitual, doméstica, se desloca, e entre o ato e a página se instaura a estranheza que a dificulta. Vou para perto, logo ali, uma reta ao fim da qual avistamos uma subida que continua assim por muito tempo, até que finalmente chegamos, quando já desconfiávamos de que a angulação em decolagem não cessaria. Devemos passar por esse hotel onde eu um dia estive. Ainda criança, talvez seis ou sete anos. O corpo arranhado de uma queda de skate, um anzol que se pendurou na roupa, uma prancha quebrada na piscina. Numa das histórias que conto a minha filha, ele é assombrado. Agora ela me pergunta se podemos dormir lá.

Apocalipse

  Disparo num carro que não comando porque não sei dirigir, mas isso não importa agora. Um prédio desaba ao fundo, ruidoso. Uma ponte desmorona vagarosamente, como alguém que derrubasse uma pilha de pratos em câmera lenta no chão da cozinha de um restaurante, digo a mim mesmo sem conseguir explicar a natureza dessa imagem. Há fogo e explosões, mas não se sabe onde. Adivinham-se fumaça e gritos vindos de uma rua próxima, mas de lá não se descobre ninguém, nem vivos nem mortos, tampouco mortos-vivos. Sei que estou sonhando, algo me adverte de que o registro não é pra valer, como se houvesse um diretor por trás do pano piscando pra mim, e por isso desejo continuar. Porque sei que posso me arriscar, ao menos aqui, como se usasse as boias na piscina ou estivesse certo de que, se saltasse agora, haveria uma rede de proteção. Estou gostando do que vejo, jogando meu próprio sonho, num cruzamento entre virtualidade e realidade, entre descuido e consciência. Uma zona de risco calculado em meio a

Sequências

  Todo dia os mesmos números, ou talvez sejam números distintos, com uma diferença de apenas um ou dois algarismos, não posso ter certeza. O celular toca, eu atendo, digo oi ou olá ou boa tarde ou bom dia, uma gravação começa e então desliga sozinha. Bloqueio o número, não quero que volte a ligar, mas outro é discado em algum lugar por uma mão ou programa cujo propósito é esse. Fazer contato com quem não quer mais atender um telefonema ou evitar isso a todo custo. Mas há sempre um modo de encontrar quem se esconde, a gente nunca está totalmente protegida ou a salvo do que teme ou provoca algum tipo de temor inexplicável. Essas ligações começam sempre nos dias pares, muito cedo da manhã. Depois seguem pela tarde e entram pela noite. Às vezes apenas números ímpares. Noutras, sequências que intercalam senhas antigas de cartão de crédito ou números primos, divisíveis por dois, múltiplos de três e por aí vai. Padrões, alguns mais evidentes, outros menos escancarados, como esse de ontem. Me