Não sei quem je suis, se o Charlie ou o Ahmed ou se o cara que se escondeu no freezer do supermercado quando a coisa ficou feia lá fora. Talvez preferisse je suis a menina cuja foto acabo de ver no Facebook e que, por um segundo, me fez perder o fôlego, a calma, a certeza de que está tudo bem, obrigado. Sem nunca tê-la conhecido antes na vida, conheci a foto da menina de sorriso fácil, alegre, um polegar erguido, os olhos puxados e, logo acima, a frase do pai, atordoante, irredutível, esse tipo de frase que a gente lê e relê à procura do erro, de algo que aponte para uma falha de compreensão. A frase é: “Minha filhinha morreu”. Je suis esse pai. Se tiver de ser, serei também essa garota que não tive tempo de encontrar. Je suis é uma questão ainda tão complicada. Fico me perguntando se mais gente chega aos trinta e poucos sem saber ao certo quem je suis ou, pior, se algum dia terá a segurança de que je suis do fundo do peito, assim, sem sombra de dúvida, esse tipo
HENRIQUE ARAÚJO (https://tinyletter.com/Oskarsays)