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Postagens

Mostrando postagens de outubro 9, 2021

Nota explicativa

  Convém situar temporal e emocionalmente as últimas postagens, parte das quais motivada – eu diria estimuladas, catapultadas ou mesmo arremessadas – por um fator algo casual, algo esotérico, a saber: uma música do Tame Impala em ritmo de suingueira na qual estive preso por cerca de 15 minutos, que depois viraram meia hora, talvez 45min, de maneira que o entrechoque de camadas sonoras e culturais, entre som e imagem, entre suporte e mensagem, entre emissão e recepção – considerando tudo isso, me vi na posição de recorrer à escrita para expressar o que essa peça havia causado, tentando dar forma ao estupor e ao ímpeto de transformar esse mesmo hibridismo em manufatura literária, mas é óbvio que sequer me atrevi a cometer tal empreitada, de resto condenada desde sempre ao fracasso. Mas, de tudo isso, fica, é certo, o prazer da fruição, a surpresa, o reconhecimento ao labor artístico de quem, se achando sem ter o que fazer em algum momento do seu dia ou da noite, jogou uma base de suingue

Perestroika

  Mesmo cansado, decido anotar uma ideia, que logo não me parece mais digna de qualquer atenção, de modo que a deixo de lado enquanto escrevo. E então o pensamento se volta a outro assunto, um tema que não aquele inicial, enredando-se no próprio rabo, cavoucando a razão pela qual julguei que seria interessante – necessário – escrever qualquer coisa que me fizesse esquecer o dia extenuante de trabalho e as pequenas dores de cabeça que marcam uma rotina de telefonemas e textos escritos a uma velocidade cujo andamento às vezes me impede de ler o que estou escrevendo, o que vai ali, como acontece agora. Apenas depois de feito é que paro e me ponho a averiguar tudo, a pensar se de fato se trata disso ou daquilo, se estou bem, se considero tomar banho antes de dormir ou se, vencido pelas horas acumuladas, essas horas que pesam no corpo como dívidas numa caderneta de fiado ou como as orelhas penduradas no colar do coronel Kurtz, talvez seja preferível me jogar na cama desse jeito mesmo. Sem m

A impotência do potente

  De tudo que leio e escuto em artigos, entrevistas e talk shows engajados, talvez potente seja o que mais incomoda. A exaustão da palavra, sua impotência mesmo, referida sistematicamente e a propósito de qualquer coisa. Uma fala, uma postagem, uma música, uma tirinha, um vídeo do TikTok, uma receita da avó, uma dança nova, uma tatuagem, um hambúrguer: tudo é potente, dito desse modo cheio de gravidade que pretende fazer do ato mais do que é, de excepcionalizá-lo, conferindo à expressão uma áurea sacra que dispensa comentários e maiores reflexões. Se é potente, é bom. Me pergunto em que momento o potente se tornou o seu contrário, o impotente, se foi antes ou depois da morte da narrativa. Se ambas vieram a óbito simultaneamente, fruto do mesmo processo de erosão linguístico, qual seja, o abuso do emprego de um vocábulo, despindo-o, ao cabo de tanto tempo, de substância e significação, restando de seu sentido e força originais apenas bagaço. Com a narrativa deu-se algo semelhante, manej