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Mostrando postagens de outubro 29, 2021

Amiguismo

  O que vem a ser o "amiguismo"? Uma ética fundada na relação pessoal, uma estética da proximidade, uma lógica de proceder que toma a eletividade como principal eixo, a partir do qual tudo o mais é desimportante. Em Fortaleza o amiguismo é um expoente do pensamento, um norte moral e social, sem ele não se chupa um picolé. Daí o silêncio, derivado dos grandes consensos não confessados, da rede tentacular de relações que se estabelece entre os conhecidos. Todo mundo conhece alguém que conhece alguém, de modo que é melhor deixar quieto mesmo quando a crítica é pertinente, o que também vale para o contrário: se é inimigo de outrem, passa a ser meu, ganham-se e expurgam-se amizades em função de elos pessoais. Até aí tudo bem, gente que vem, gente que vai. Mas o amiguismo é escola forte o bastante para ir além do círculo da mesa de bar, além dos cercadinhos afetivos e sociais em torno dos quais a vida se resolve e flui aos solavancos. Influi no trabalho, nas atividades de cada um,

Uma chuva

Uma chuva passou pela rua agorinha, eu a vi se aproximar de longe, até abri a janela e depois fechei-a, não queria correr o risco de que molhasse os livros mais próximos do parapeito, mas, de verdade, nem teria precisado, a chuva acabou no meio do caminho, se perdeu, quando olhei tinha passado, não era mais nada. Durou o tempo de levantar da cadeira e chegar à sala para fechar a porta. Uma chuva rápida, tão rápida que me pergunto agora se de fato choveu ou se foi ilusão, não lembro de tê-la visto passar, tampouco de molhar o asfalto. Era chuva ou engano? Continua quente, pelo menos tão quente quanto antes da chuva, tento lembrar se no mês de outubro já faz tanto calor assim e acho que consigo. Acho que posso recuperar uma parte desse tempo que perdi. É sempre tão fundo quando a memória recua que tenho receio de não voltar mais depois de entrar na massa escura. Em janeiro esfria, depois é agradável até junho ou julho, agosto é sempre um pouco de cada estação, setembro e outubro nos prep

A safadeza não tem limites

  Soube por acaso que o cantor cujo nome carrega a safadeza como predicado brindou ao fim da pandemia durante um show realizado no México depois de ter furado a fila da vacina em Fortaleza, avançando na vez de muita gente – na minha, inclusive – e oferecendo o braço à agulhada única da Janssen. Depois disso, ressentiu-se dos termos da negociação com as autoridades, que lhe deram uma alternativa. Em vez de se tornar alvo de uma ação penal, pagar uma quantia a uma instituição social qualquer, pública ou privada. O cantor recusou. O valor, de R$ 792 mil, é alto, alega. E arremata: quero ser tratado como cidadão comum. Veja só: o artista furou a fila da imunização contra uma doença que matou 600 mil pessoas. Não apenas ele, mas também a esposa e uma assistente. Arquitetaram tudo, contaram com apoio, ajuntaram-se com outros e, no dia certo, na hora H, saíram rumo a um shopping da cidade para tomar uma vacina de dose única, o que lhe permitiria sair com agenda de apresentações pelo mundo. Em