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Mostrando postagens de maio 1, 2021

À irmã a quem não pude amar

  Eu tive uma irmã. Está escrito numa bíblia antiga que minha mãe comprou quando ainda éramos crianças, de modo que o livro tem praticamente a minha idade, ou talvez seja mais velho. É um volume robusto, de letra graúda, com reproduções de pinturas renascentistas, mas cuja capa estragou-se com o tempo, e por isso o trouxe para casa, a fim de restaurá-lo e guardá-lo comigo, como artefato capaz de ligar minha história à de minha mãe e, de alguma maneira, à do restante da família, como um elo artificioso que tenho de fixar para que tudo não se perca em vazio, para atenuar essa sensação de que a deriva é nossa origem comum, e não uma casa ou cidade. Na folha de rosto da bíblia, no local destinado a anotações pessoais, a mãe escreveu nossa data de nascimento, nome e filiação, além da data de casamento: setembro de 1979. Cláudia nascera em 1º de maio de 1981. Eu não sabia ou não recordava que hoje era o seu aniversário. A irmã faria 40 anos, igualando-se a mim por um período curto que talvez