Ontem encontrei uma velha no Centro. Digo velha mesmo, sem frescuras. Nada de idosa ou senhora muito velhinha. Velha e pronto. Estava encostado num poste. Precisamente: esperava o ônibus escondido na sombra mínima que esse poste projetava. Estava bem próximo da base. Além de mim, havia outras seis pessoas distribuídas ao longo da sombra. Até acabar. Uma delas era a velha. Estava bem ao meu lado. “Olha”, disse. Eu ouvia música. Os ouvidos tapados, a cabeça noutra dimensão. Ouvia alguma coisa melosa, romântica. Pra combinar com dias tão quentes e melosos. A cabeça tinha sido varrida por uma caminhada de dez quarteirões da praça do Ferreira até ali. Havia fumado também. Não costumo fumar, mas, por algum motivo, comecei há dois dias e até agora é o que tenho feito. Olhei. Era uma árvore. Uma plantinha que nascera sobre a fachada de uma ótica. Estava ali, como se alguém a tivesse plantado exatamente naquele lugar. Tratei de imaginar a coisa. Alguém plantando a árvore sobre a superfície nada
HENRIQUE ARAÚJO (https://tinyletter.com/Oskarsays)