Tem dias que a gente acorda no meio da noite sem motivo, sem desculpa vai e levanta, vai e desperta, vai e não quer apenas aliviar alguma dor, mas encará-la duramente porque na madrugada não há esconderijos, tudo se mostra, tudo é gravidade, e se no corredor ouvem-se passos e se no telhado ouvem-se gritos e na janela entrevêem-se vultos, há que os ouvir, tatear, mesmo sufocando calores da noite, mesmo desejando fortemente que as duas horas que ainda restam sumam feito pó soprado por ventania, porque, se a madrugada tem modos diversos de operar, se ela atravessa medos e agonias é minimamente razoável aceitar tudo que sobrevier. E enxergar o que está adiante, que é existir.
HENRIQUE ARAÚJO (https://tinyletter.com/Oskarsays)