Até hoje não entendo aquele fosso do desenho do He-man, uma queda livre, uma lonjura sem tamanho, um cânion de onde ninguém saía, tampouco caía. Num desenho infantil dificilmente uma pessoa, ainda que vilã, seria castigada tão cruelmente assim. Mas a queda estava lá, parada, a meter medo. O fosso foi minha primeira experiência com o infinito. Antes de haver deus, havia a queda livre. A ideia de algo tão fundo que, mesmo que passasse a vida inteira caindo, jamais chegaria ao final. O tempo suspenso. Daí que fosse inapropriado falar simplesmente final. Era mais um despencar contínuo solitário, uniforme e inapelavelmente vertical. Pensando bem, até que não seria ruim. A eternidade em queda. Um tipo especial de inferno. Um inferno pras crianças malcriadas. O He-Man gostava das lições de moral ao fim de cada episódio. Começava assim: na história de hoje, nós aprendemos... Assisti-lo, logo, pressupunha um evangelho: amizade, respeito, camaradagem. A lista de boas ações
HENRIQUE ARAÚJO (https://tinyletter.com/Oskarsays)