Coleciono inícios, palavras soltas, restos de frases, pedaços e quinas das coisas que podem servir. Se acontece de ter uma ideia, anoto mentalmente, sem compromisso. Digo a mim mesmo que não esquecerei, mas sempre esqueço depois de umas poucas horas andando pela casa.
Às vezes penso: dá uma boa história, sem saber ao certo de onde partiria, aonde chegaria, se seria realmente uma história com começo, meio e final, se valeria a pena investir tempo, se ao cabo de tantos dias dedicado a escrevê-la ela me traria mais felicidade ou mais tristeza, se estaria satisfeito em tê-la concluído ou largando-a pela metade.
Enfim, essas dúvidas naturais num processo qualquer de escrita de narrativas que não são como essas coisas que fazemos todo dia, que eu faço todo dia.
Mesmo com essa dificuldade, vou juntando, acumulando. Tenho uma gaveta inteira repleta desses “quase”, uma seção da estante onde armazeno o incompleto. Todo um setor da biblioteca destinado ao inacabado.
Crio uma novela, mas canso de tudo antes da metade, mantendo-a ao alcance da mão por algum tempo ainda antes de finalmente entender que dali não resultará nada de bom.
Talvez a saída fosse fazer tudo aos poucos, mas então eu precisaria de mais do que uma vida para terminar o menos ambicioso dos projetos. Um conto, por exemplo.
Outro dia formei algo ao acaso, a justaposição de partes avulsas, peças sem encaixe natural que coloquei lado a lado sem motivo algum. Como passageiros de um ônibus apanhados à revelia. Nada harmônico ou agradável, mas possível. Olhei ao final e me pareceu algo possível, uma coisa para a qual alguém pudesse se voltar e de repente entender que ali se revela uma história.
Comentários