Enquanto escrevo sobre essa ideia de que o fim está perto, falências, explosões, tornados, fenômenos inexplicáveis, tempestades de areia, o surgimento de sinais que parecem bíblicos e remetem ao apocalipse, de repente entra uma mariposa no quarto através da janela aberta.
Passa das duas da manhã. A mariposa borboleteia e se desapruma em torno da lâmpada acesa, cai aos poucos, perde altitude exatamente como um avião em parafuso. É finalmente apanhada pelo gato, que havia se esgueirado sem que eu o tivesse visto e, no momento certo, deu o bote. Depois saiu com a mariposa na boca parecendo um longo bigode como o de Nietzsche.
Uma visão engraçada e triste, engraçada porque meu gato até hoje não havia capturado nada, mesmo uma barata mais lerda lhe escapa facilmente das garras. E triste porque era uma grande mariposa marrom, de asas farfalhantes e voo irresoluto, caótico, que desenhava no ar figuras geométricas nunca vistas, a primeira que entrara no quarto, quem sabe a última também.
E ela se foi, o gato comeu-a num instante. Parou de bater as asas no segundo seguinte ao do salto do animal, que agora mia na sala, talvez porque tenha descoberto que uma mariposa morta não lhe serve de nada, para comer ou brincar, e que o melhor teria sido deixá-la viva, voando pela casa, batendo-se contra os móveis e zanzando acima de sua cabeça, de modo que ele pudesse acompanhar seus movimentos encantatórios daqui de baixo, sem alcançá-la.
De volta ao texto que preparo, entendo tudo como mais um signo do fim próximo, da exaustão de certa ordem após a qual o mundo fica por conta própria e nós, a espécie dominante, nos despedimos até a próxima, dando adeus e fazendo votos de que em algum momento a gente tenha outra oportunidade de voltar a habitar este chão de terra, amém.
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