Há meses compramos um cubo mágico, que agora mantenho a meu lado, como um totem. Repousa sobre uma impressora velha que acumula poeira. Divide o lugar com um pinguim que ganhei de uma revista em visita a uma feira de livros muito tempo atrás.
Olho pra ele, procuro decifrá-lo à distância, sem tocar nas suas faces. As cores embaralhadas. Breves combinações e sequências que tento encaixar, sem sucesso, mas talvez esse objeto não se possa reduzir a esse papel a partir do qual alguém o maneja a fim de ser bem-sucedido.
Resisto à tentação de procurar pistas na internet, vídeos que me ensinem a montar o cubo, fórmulas que abreviariam o trabalho de organizar passo a passo cada um dos pequenos quadrados dentro do quadrado maior.
Uma infinidade de possibilidades, como devem imaginar. Seis rostos, cada um dotado de nove fragmentos distribuídos em meia dúzia de cores.
Tenho esses orgulhos infantis, competitivos. Recuso o atalho em certas situações apenas por vaidade. Esta é uma delas. Posso não montar jamais o cubo mágico, mas nunca o farei auxiliado por um golpe do tipo.
Outro dia deitei na cama depois do almoço. Dei voltas com a peça nas mãos, senti seu peso, testei sua fluidez. Em seguida, desfiz uma boa combinação na esperança de, mais à frente, conseguir obter um ganho maior. Recuar para avançar. Mas apenas recuei, e o avanço esperado ficou por acontecer, prejudicado.
O cubo mágico é um brinquedo demoníaco, penso.
Comprei-o supondo que ajudaria com o estresse, mas entendi logo cedo que o efeito é contrário ao pretendido, ou seja, que ele causa certo nível de tensão.
Até que tudo passa. Depois de horas jogando, nos vemos movendo peças arbitrariamente. Primeiro imaginando que o mero deslocamento cartesiano é suficiente para resolver o problema do cubo. E finalmente entendendo que o cubo não se rege por essa lógica.
Esse é o seu problema e o seu segredo. Mesmo sendo mágico, não comporta mágica nenhuma. Não há um truque mediante o qual seja possível solucioná-lo.
Na verdade, o cubo mágico é um conjunto de desafios a serem resolvidos simultaneamente. Nele é quase impossível separar e prosperar por partes. Ou se avança no todo ou não há progresso. Tudo se conecta.
Amanhã tentarei movê-lo do lugar, fazer qualquer coisa com ele, sentir que posso vencê-lo aos poucos, por insistência. Evito o contato durante a semana, quando o trabalho de escrever exige mais de mim e a energia escasseia, chegando ao volume morto em alguns dias.
Mas, assim que tenho condições, eu o ataco. O cubo se defende embaralhando caminhos que eu já havia intuído antes. É o caso de agora.
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