A mãe enviou hoje pelo WhatsApp a foto do meu avô. É uma novidade para mim, não o conheci, sequer seu rosto eu tinha visto até agora. Eu lhe disse há uma semana que gostaria de vê-lo, se possível.
Então ela falou que uma tia com quem não tenho mais contato mantinha fotos antigas da família. É essa foto que tenho agora. Uma imagem extraída do convite para a missa de corpo presente, datada de outubro de 1981, eu tinha um ano quando meu avô morreu.
Pergunto por que ele tem um nome diferente do que o que tinha, a mãe explica que o avô decidira adotar o nome da segunda esposa, por isso a discrepância. E acrescenta que ele era “um homem com problemas”, sem se aprofundar no assunto. Tampouco perguntei, não tenho interesse em sua história, ou finjo não ter.
O avô tem um rosto feio, de animal, um nariz pronunciado e olhos miúdos, a boca fina na qual reconheço a minha própria.
Disse à mãe que lembrava nossos traços, ela se irritou, eu respondi que era brincadeira. Estranho vê-lo e não sentir nada, entre nós nenhum elo afetivo, qualquer sentimento.
O pai da minha mãe, o marido da minha avó, um homem cujo paradeiro jamais era mencionado em casa, em torno de quem reinava o segredo, um forasteiro, um extraviado que talvez fizesse melhor mesmo em se mandar para longe, deixando pra trás os 14 filhos, entre eles minha mãe.
Na prole suas marcas diluídas: os olhos azuis, a pele alva, o mesmo conjunto fenotípico replicado, e em seguida os netos e netas copiando-o, numa cadeia sem fim.
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