Quando a vó falava “para o ano” (pronuncia-se “paruano”), eu entendia como um pedido para que eu interrompesse tudo que estava fazendo naquele momento e parasse o ano de fato.
Era uma ordem, e eu cumpria ordens da minha vó, como quando ela gritava da porta da minha casa me chamando pra tomar o mingau e eu, que já tinha dez anos e estava cercado amigos batendo papo na esquina, punha o rabo entre as pernas e voltava.
Por causa da vó passei a gostar da expressão, mesmo sem entendê-la totalmente. Para o ano sempre foi mais que o ano que vem. Era o ano em que coisas não permitidas agora passariam a ser.
“Para o ano” vai escrever de caneta no caderno, para o ano vai sozinho pra escola, para o ano já pode tirar título de eleitor, para o ano não dou mais banho em você e por aí vai.
Pro moleque que eu era, para o ano sempre teve esse sentido de amadurecimento mais que meramente de mudança na folha do calendário. Mas daí fui crescendo e depois vi que isso era coisa da minha cabeça e que a acepção corrente é essa que denota o ano novo – o para o ano era nada menos que uma ficção.
Tudo que sobreviria já existia aqui e agora.
Assim como todo ano que começa, sobre o qual projetamos responsabilidades e a quem atribuímos dívidas já de partida, sendo a pior a tarefa de superar o antecessor, abundando em boas notícias e deixando de lado as más.
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