A história da família como a da cidade, uma rasura sobre rasura, nela escreveu-se sobre o que já se tinha escrito. Mas é preciso encontrar nesse exercício de exaustão e desaparecimento uma grafia, ainda que seja a história de um findar-se, a história de impor-se a si e aos seus um contínuo renovar-se que é também um morrer atualizado. Na família a morte sempre rondou, os mitos domésticos cercados de casos de dissolução física, escapes e desatinos, um disfarce de onde se veio. Nenhum retorno, apenas partida, um desaterro dia após dia.
Coleciono inícios, restos de frases, pedaços e quinas das coisas que podem eventualmente servir, como um construtor cuja obra é sempre uma potência não realizada. Fios e tralhas, objetos guardados em latas de biscoito amanteigado, recipientes que um dia acondicionaram substâncias jamais sabidas. Se acontece de ter uma ideia, por exemplo, anoto mentalmente, sem compromisso. Digo a mim mesmo que não esquecerei, mas sempre esqueço depois de umas poucas horas andando pela casa, um segundo antes de tropeçar na pedra do sono ou de cair no precipício dos dias úteis. Às vezes penso: dá uma boa história, sem saber ao certo de onde partiria, aonde chegaria, se seria realmente uma história com começo, meio e final, se valeria a pena investir tempo, se ao cabo de tantos dias dedicado a escrevê-la ela me traria mais felicidade ou mais tristeza, se estaria satisfeito em tê-la concluído ou largando-a pela metade. Enfim, essas dúvidas naturais num processo qualquer de escrita de narrativas que não são
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