Às vezes acontece de esquecer a roupa na máquina e então precisar voltar e acionar novamente o mecanismo que faz as pás girarem, mas elas giram de fato?
Não, as roupas é que entram no movimento centrífugo e lá permanecem, passando do molho curto ao molho longo, a depender do gosto.
Antes, porém, ficam em repouso, enxaguando. Submersas, perdem a sujeira, despem-se de oleosidade. Se muito encardidas, embranquecem. Se repletas de marcas, alvejam.
A máquina é consultório, lugar aonde vão para se recuperar e deixar para trás o que quer que seja.
Quando a esqueço em funcionamento, tenho sempre essa sensação de que falta algo. Como um sexto sentido que permanece alerta e voltado exclusivamente para esses pequenos eventos da casa: a luz acesa, o fogão ligado, a geladeira aberta, a TV iluminando a sala no meio da noite.
Assim é com a roupa deixada dentro da máquina. É um desperdício, digo a mim mesmo ao descobrir que as peças que havia jogado na boca aberta e depois fechado ainda estão lá.
Mas com uma diferença. Fedem. Fedem a roupa esquecida dentro de uma máquina fechada por horas, como é o meu caso.
Daí preciso voltar a lavá-las, deixá-las por mais algum tempo sendo jogadas pra lá e pra cá até que percam o que levam consigo do corpo que as veste.
E então me sento de novo no sofá para tornar a esquecê-las mais uma vez. E uma terceira e uma quarta.
Numa quinta lavagem é caso de parar e pensar se esse esquecimento não mecanismo proposital acionado por sabe-se lá que estratagemas psíquicos.
Afinal, uma máquina de lavar é uma máquina que lava o corpo ao avesso.
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