Uma repetição: listas e mais
listas. De objetos e deveres, coisas que devemos por em ordem, livros por
analisar e episódios por entender. Itens da cozinha e da sala, tópicos de uma
discussão já de antemão perdida e sem a qual passo bem. Listas de utensílios a
levar ao conserto porque estão gastos ou falhos para o cotidiano.
Um prazer: o vento que sopra
desde ontem, rajadas que atravessam a casa inteira, desarranjam as roupas e
fazem as capas dos livros baterem como se vivas. Um vento nem agressivo nem
tenro, apenas força.
Um fato banal: espetei o dedo
ao cortar as unhas, cortei-as porque não sei digitar sem antes deixá-las rente,
de modo que não arranhem as palavras, mas escorram, deslizem, fluam.
Um palpite: talvez chova porque
lá fora está quente e o céu muito bonito, de um azul escuro junino que não vejo
há muito.
Uma condição: agora bebo goles
demorados. Escrevo e bebo, uma coisa parte de outra. Uma taça de
repouso ao lado do computador como essas pessoas que esperam o ônibus na alta
madrugada.
Uma platitude: ainda é junho, e
o ano se demora. Aguardo o momento da disparada. Tenho pressa em andar, ir mais
longe em direção aos outros dias.
Uma saudade: do cigarro que já
não fumo há quase cinco meses. Menos do gesto, que disso tenho pavor, a
afetação da mão que faz pender o cigarro, mas do sopro e da fumaça. Saudade da
garganta repleta de aridez e dos olhos quentes.
Uma dificuldade: parar e
descansar, a vida tão cheia de obrigações. Ontem mesmo senti que as mãos se
avermelhavam e os punhos inflamavam, as articulações enrijecidas de tantos dias
percorridos batucando o quê? Essas histórias de uma república em queda livre,
as notícias do banal, as mesmas dez ou quinze palavras: ele disse, ela falou,
ele anunciou e por aí vai.
Uma mensagem: no prédio do
vizinho a luz finalmente apagada.
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