E o livro que encontra na
estante ao acaso antes de dormir é este que tem poemas como
facas que cortam o ar, poemas como massas e gestos suspensos, poemas como se me
pedissem para contar o primeiro pensamento da infância.
Poemas todos criados por uma
força que se agrupa no mais baixo do ventre e no mais alto da cabeça e no mais fundo
dos olhos.
Poemas contra a leveza.
Letras e sinais
gráficos e depois as conjunções adverbiais são as primeiras a afundar quando
atiramos tudo ao mar, arrependidos que estamos do que dissemos e escrevemos.
E agora resta somente rasurar à espera de que esta outra história se firme no papel, e depois festejar o prumo e a sombra que projeta.
E agora resta somente rasurar à espera de que esta outra história se firme no papel, e depois festejar o prumo e a sombra que projeta.
Esse livro que ela traz até aqui carregado
nas mãos como bicho morto encontrado à beira da estrada a quem o criador pedisse que
fosse até o mais longe para enterrar porque ele não tem mais nem forças nem
recursos - esse livro é um engano.
Então partimos madrugada
adentro feito estivéssemos num conto de Moreira Campos escapando de visagens e ameaças de
homens em caminhões que cavam mentalmente as nossas tumbas antes de nos enfiarem lá dentro.
Como somos jovens e espertos, corremos à mata assim
mesmo com medo mas tentando chegar ao outro lado, que nunca há de haver esse avesso.
E nisso sorrimos.
Ela então devolve o livro ao lugar de onde o retirara instantes atrás. Depois deita na cama enrodilhada, um gato antigo da casa.
Pede que durma ali, e eu digo que agora já é tarde pra dormir.
Pede que durma ali, e eu digo que agora já é tarde pra dormir.
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