Experimentar e usar uma roupa que não é a
sua, vestir essa roupa estranha e levá-la a passeio.
Só uma vez fui a um brechó. Pouco antes de
viajar, precisava de uma camisa de frio, uma que se parecesse comigo, que fosse
minha e estivesse de acordo com meu tamanho. Não encontrei.
Eram ou largas demais ou muito curtas,
nenhuma me cabia, nenhuma ao agrado. Mas levei uma blusa assim mesmo.
Em casa deixei no guarda-roupa para que fosse
tomando o gosto das outras roupas, todas velhas, todas compradas cinco ou mais
anos antes.
Como esta camisa preta de mangas longas que
uso agora. Está cinza e se descostura em alguns pontos, mas já foi muito escura
e tinha cheiro de novidade. Era bonita, gostava de vesti-la quase sempre, muita
gente dizia que ficava bem e era assim que me sentia ao usá-la.
Desgastou-se, ficou como velha e já não
combina com os ambientes fora da casa. Quando saímos, dizem que é uma roupa surrada,
fazem chacota. Dizem: convém não estar assim tão desleixado no trabalho ou numa
festa. Concordo com a cabeça, sei que é isso mesmo.
Hoje raramente estamos juntos, mas às vezes acontece
de precisar da ajuda de uma roupa que já me conhece e com a qual não preciso trocar mais que duas palavras para que entenda tudo.
Borrifo água, engomo, dobro as mangas, exatamente como fazia antigamente. E penso que podia ser a camisa de
outra pessoa, uma peça encontrada num brechó, uma que olharia antes de passar
no caixa.
Quanto custa esta roupa?, eu perguntaria, sem perceber que o preço de tudo já vai embutido na própria matéria.
Quanto custa esta roupa?, eu perguntaria, sem perceber que o preço de tudo já vai embutido na própria matéria.
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