Gosto por gosto mesmo de
abrir ao acaso um livro. Mais ou menos como uma cartomante que pede que
retiremos uma carta de um leque de outras cartas e nessa escolha tente
adivinhar sabe-se lá que futuros traçados não antes nem depois, mas naquele
instante.
Gosto de, ao abrir, adivinhar
no título do poema escolhido ao acaso uma senha ou contrassenha, um presságio,
uma sorte lançada, um sussurro de mensagem esquecida em garrafa jamais
encontrada.
Gosto mais ainda de
casualmente ler e encontrar nas entrelinhas do poema que saltou por roleta
russa um conselho, mas poemas não aconselham. Poemas desaconselham, poemas ensinam ao revés.
Este, por exemplo, caiu assim
feito um passaporte. Carver, “Esta vida”. Uma dança antiga. O minueto. Reabri e tornei a fechar o livro, mas
jamais se repetiu o gesto de mãos que vaga e depois vai ao mesmo ponto, chega ao mesmo canto. O poema de Carver. Esta vida. Apenas hoje,
agora.
Na capa a foto do poeta, que se inclina levemente pra cima, muito aprumado e vestido, a caneta em riste a grafar anotações sobre a folha escrita na máquina. Nada é desalinho, exceto o poema.
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