Conto uma história pra
terminar antes que o mundo termine.
Quando estive em casa pela
última vez, talvez em inícios de setembro ou fins de agosto, fizemos algo
curioso. Batemos num saco de boxe. Calcei luvas e me pus em posição de pugilato. Precisava esmurrar o saco, que não revida, apenas recebe as pancadas e balança
levemente, a depender da intensidade e da frequência dos golpes com que é
atingido.
Estive assim por cerca de 15
minutos, primeiro sozinho, depois acompanhado por meu irmão e meu pai, ambos
lutadores amadores, mais amadores que lutadores, exceto por meu irmão, que realmente
pode se considerar um cara que aplicaria uma boa surra em qualquer pessoa na
rua se quisesse de fato. Mas ele é um sujeito manso, muito mais manso que eu,
por exemplo.
Eu me divertia batendo, e não
apenas por bater, mas por fazer isso na frente dos dois, que me olhavam e davam
risinhos irônicos do tipo "veja como bate no saco". Então fui aumentando a força
e a frequência, relembrando lutas clássicas que vi, tentando imitar os caras
durões que já subiram nos ringues contra outros caras durões. Dei o máximo que pude para me parecer com Rocky, mas talvez não tenha tido muito sucesso. A certa altura, estava pingando suor e tinha uma das mãos cortada mesmo com a luva.
Foi então que o pai brincou: venha pra cá no sábado pra gente trocar uns
sopapos. Era um desafio.
Hoje é sábado, eu não fui,
estou escrevendo sobre a luta que teria com meu pai se tivesse ido até a casa
da minha mãe.
A última vez que lutamos foi
quando eu era criança ainda. Estávamos no quintal da minha avó e ele me acertou
um jab que me atingiu o lábio e cortou, fazendo escapar bastante sangue e sujar
minha camisa.
Hoje eu teria lutado, teria
batido e apanhado, teria perguntado: afinal, por onde andavam todas as pessoas
da família, por que tudo havia tomado aquele rumo, por que sempre dizem que o
mundo acaba, mas na verdade ele sempre continua.
Teríamos muito a dizer um ao
outro, mas eu não fui. Estou escrevendo, e, ao escrever, imaginando como teria
sido uma luta entre pai e filho.
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