É agosto, mês de ventos. A
gente bota a cabeça na janela e tudo acontece. Tem sido difícil andar de
bicicleta. O vento contra na ida e a favor na volta. Subir é mais difícil e
descer, mais fácil.
Pedalar contra o vento. Descer
a favor do vento. Mais lento e mais rápido ao mesmo tempo. Duas experiências.
Na praia ando pra lá e pra
cá, vou até o final, que é a igreja. Paro e olho lá pra dentro imaginando
outras tantas vezes em que parei ali e olhei e não vi nada porque as portas
estavam fechadas.
É uma igreja simpática, pequena,
azul e branco, como um barco parado. Tenho vontade de rezar, mas não rezo. Não é
zelo. Apenas não quero.
Penso em sorvete, uma
casquinha dupla de tangerina e qualquer outro sabor. Não paro. Aumento o volume
e a mensagem diz que posso danificar a audição. Aumento assim mesmo.
Um homem passa com uma caixa
de som na cestinha da bicicleta. Está lá sempre nos fins de semana. Já cruzei
com ele outras vezes. Por que escuta música tão alta? Passa sorrindo. É um
sorriso estúpido.
Decido continuar, mas enquanto
ando penso que todo mundo está tentando esquecer alguma coisa e quase todo
mundo falha, se não na descida, falha na subida. O vento é forte, quase me
derruba.
A praia está cheia. Meninas,
biquínis, corpos. Todos comprimidos. Uma música no meio da areia. Cigarro. Cheiro
forte de maresia e maconha. Idealizo. Fim de tarde, luz laranja, um palco
montado ali perto. Vou embora.
Tiro as mãos e a bicicleta
treme um pouco. Continuo assim até o fim da avenida.
Volto e prometo ir mais uma
vez até a igreja. O vento contra agora. Os músculos das pernas ardem, a mesma
dor atrás da cabeça, o corpo rangendo. Corpo velho.
Não ouço a música, agora vejo
apenas os canos, grandes e enferrujados, semienterrados, ruína. Lembro quando
chegaram. Eram como alienígenas, aquele corpo metálico imenso e fálico
estendido na areia como um animal abissal encalhado magicamente depois de uma
das ressacas furiosas do mar.
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