Um homem no calçadão. Eu passava de bicicleta. Ele estava lá, parado feito uma das pedras. Mas algo não serenava. Recebe fotos, imagens contidas num álbum, um desses álbuns que toda família guarda e que depois, perto do Natal ou num domingo, alguém decide exumar no meio da sala.
Outro homem se aproxima enquanto eu encosto a bicicleta metros adiante, à sombra. Os homens conversando e eu assistindo, tapando o sol que vinha, mais claridade que sol, fazendo aba com a mão direita e com a esquerda segurando a bicicleta, que prendia também com as pernas, mais ou menos como se estivesse montado num cavalo.
O segundo homem vai embora. O primeiro fica. Caminha até as pedras onde as ondas quebram, onde os vasilhames e restos do tempo doméstico se sedimentam e viram esse coral de quinquilharias imprestáveis.
O homem olha um tempo. Tem os braços pendentes do corpo como frases desconexas num texto que vai perdendo o sentido aos poucos. E então os levanta, aproximando as mãos da cabeça, num esforço de enxergar algo que a luz teima em escurecer. A vista contra a luz escurece.
Eram fotos, claro que eram, e o homem estuda cada uma delas de um modo clandestino ou nostálgico, não dá pra ter certeza. Apenas que, ali, parado nas pedras, às 11 horas e pouco de um dia de semana, tinha interrompido os afazeres, se é que havia algum, e ficado a olhar para um punhado de pedaços de tempo, de frente para o mar, recordando ou tentando esquecer, que é tudo a mesma coisa.
E, nesse movimento, marcado por ondas e temperado nesse sol, tinha-se passado mais ou menos meia hora. Um pouco mais, talvez. Não dá pra ter certeza disso também.