Tô convencida de que uma parte do meu aprendizado é acreditar que tudo é ruim e nada do que faça terá serventia algum dia, o que é libertador, pensem no desespero que é essa pressão de ficar à espera de que algo aconteça, algo mágico, uma volta inteira no parafuso, um passo de dança, quase como na 5ª série, quando a gente esperava que o garoto falasse com a gente o ano inteiro e o garoto ficava lá, não falava, então o ano acabava e nada tinha acontecido, apenas os garotos errados tinham puxado conversa.
Sim, agora é diferente, como sei que não farei nada, e não duvido da visão porque foi até hoje a coisa mais vívida que já sonhei, posso me dar ao luxo de fazer exatamente o oposto, ou seja, de simplesmente ir fazendo sem a pressão que falei.
É, embora esteja predestinada a não ir muito longe, a dar voos rasantes de fôlego curto que talvez sequer sejam captados nos sonares e outros aparelhos que registram os objetos que emitem energia enquanto se movem, tudo isso me leva a acreditar que sim, tenho ainda alguma chance.
Eles não captam nada porque confundem paralisia com inação, preguiça com ceticismo etc., não têm um radar assim tão preciso para os fenômenos que não entendem, o que aproxima os radares do restante das pessoas é precisamente a incapacidade de notarem movimentos sutis ou rearranjos em níveis subatômicos, subcutâneos, sub-qualquer coisa.
É, é uma conversa imaginária na maior parte do tempo, parto do princípio de que imaginar é uma maneira de inventar outra vida e de fato vivê-la, não apenas imaginá-la, quando escrevo, e é o que talvez continue a fazer pelos próximos anos, sinto que posso operar esses pequenos milagres.
Sim, no momento é o que me interessa, mas não sei até quando nem por quê, sei que depois daquele sonho em que eu me via atirada num futuro em que nada era realmente resultado do que eu esperava que fosse, como um futuro desenhado por outros para mim, mas não desejado por mim, quando me vi ali, cercada de gente estranha, comendo uma comida estranha e vestindo roupas estranhas, eu pensei que poderia tentar antecipar-me ao fracasso e tentar outra rota. Quem sabe.
Isso tudo foi sonho, claro, e quando acordei achei que podia. Que posso. Bem, é isso. Agora já posso fumar?