Agora estou tentando me acostumar. Uma das
paredes é verde, as demais de uma brancura desconcertante. O vento é mais forte
e assobia ao abrir a porta. A rua, ao contrário da outra, é silenciosa de noite
e ruidosa de manhã. A garagem da empresa de ônibus e as árvores do parque ficaram
pra trás. E as formigas também, embora ninguém tenha saudades delas.
Lembro de uma vez. Éramos um grupo de
amigos bebendo na praia no final da tarde. De repente anoitece, e algumas
meninas vão embora. Eu resolvo ficar. Entro no mar depois de decidir que não
estava tão bêbado assim. Estava. Flutuo no mar, não toco o chão com meus pés. A
água é morna. Estou sozinho, a sensação é agradável, mas também triste. O que
acontece se avançar um pouco mar adentro: avanço. Uma onda empurra pra longe. A
tontura passa. Meus pés voltam a tocar o chão arenoso do fundo da praia. Uma
água-viva se enrosca no meu dedo. Queima.
Tenho saudades do supermercado e da vizinhança. Estou cada dia mais longe, mas nunca tão longe que não possa vê-lo sempre que tiver vontade ou sempre que faltar comida.
Os objetos criam vida, animam-se. Acredito que
tudo, cadeiras e pessoas, animam-se por força de uma energia cuja origem e
duração no espaço-tempo são impossíveis de determinar.