Lembro quando ainda criança, no meio
da aula me perdia e só voltava a custo, às vezes porque a professora chamava
pelo nome, às vezes porque tocava o sino do recreio e todas as crianças saíam
em galope desenfreado. Muito tempo depois, já adulto e ainda desligado,
passaria a me referir a esses momentos como suspensão. Porque eram de fato
isso: um hiato no meio da rotina, um pequeno abismo gestado sob os pés por
força não da imaginação voluntária. Os abismos que criava eram de outra
natureza.
Gosto de como soa atacarejo, de seu poder de instaurar desde o princípio um universo semântico/sintático próprio apenas a partir da ideia fusional que é aglutinar atacado e varejo, ou seja, macro e micro, universal e local, natureza e cultura e toda essa família de dualismos que atormentam o mundo ocidental desde Platão. Nada disso resiste ao atacarejo e sua capacidade de síntese, sua captura do “zeitgeist” não apenas cearense, mas global, numa amostra viva de que pintar sua aldeia é cantar o mundo – ou seria o contrário? Já não sei, perdido que fico diante do sem número de perspectivas e da enormidade contida na ressonância da palavra, que sempre me atraiu desde que a ouvi pela primeira vez, encantado como pirilampo perto da luz, dardejado por flechas de amor – para Barthes a amorosidade é também uma gramática, com suas regras e termos, suas orações subordinadas ou coordenadas, seus termos integrantes ou acessórios e por aí vai. Mas é quase certo que Barthes não conhecesse atacarejo,...