Começo agora um exercício.
Dizem os especialistas: domingo é de longe o melhor dia para realizar pequenos consertos nas zonas habitáveis da casa. Isso sem contar a programação televisiva, tão reveladora da vida inteligente quanto o ralo do banheiro é dos costumes de um inquilino.
Dizem os especialistas: domingo é de longe o melhor dia para realizar pequenos consertos nas zonas habitáveis da casa. Isso sem contar a programação televisiva, tão reveladora da vida inteligente quanto o ralo do banheiro é dos costumes de um inquilino.
Esse exercício, uma fisioterapia sem a
parte terapêutica, tem a finalidade de recuperar os movimentos naturais do corpo, soterrados
por falta de prática, preguiça e uma crença excessiva na inesgotabilidade do
tempo. Sua metodologia é a de sempre: tentativa e erro.
Primeiro os dedos, esses miseráveis do
hábito, anões da terra média. Apontam sempre o mesmo caminho. Cavam a rocha
dura como ninguém. Escória dáctila. Agora é diferente. Um de cada vez, sem tanta pressa, vão
navegar no contrafluxo das horas bem gastas. Estão obrigados a mostrar outras
direções. Querem sempre alcançar, prender, beliscar, perfurar e deslizar, empurrar
e massagear. Não se satisfazem com pouco. Às escondidas, ruminam plano de abundância. Agrupam-se nas embocaduras do corpo. Diabretes a serviço do desejo.
Pois que aprendam uma nova lide: desembaraço, soltura, filtragem.
Pois que aprendam uma nova lide: desembaraço, soltura, filtragem.
Na sequência do exercício, a cabeça, esteira
através da qual deslizam manequins em série dando tchauzinho. A intenção é restituir à cabeça o estatuto de coisa sem valia. Como um cachorro de
camelô, torná-la só mais um treco chinês que pisca e dá cambalhotas. E mata
mosquitos. Uma cabeça apenas para o que seja fora da lide da cabeça. Cabeça-adereço, cabeça-acessório, cabeça-necessaire.
Finalmente, o restante do corpo. Até
procurei modalidades que não exigissem a participação de braços e pernas, mas
não fui além de experimentos caseiros que terminaram por, um a um, fracassar. Coito, sorvete, trocar a lâmpada, sexo oral, apanhar o ônibus – de tudo o corpo
é veículo. Pra quem sabe ler, também é mensagem.