É possível viver sem tudo isso? Por “tudo
isso” entendam “tudo isso”, expressão de abrangência relativa que designa posses
diferentes para cada pessoa e para cada pessoa uma ideia diferente de posse.
Basicamente, pergunto se é possível viver sem o que está ao alcance da mão, um pouco
mais distante, a cinco metros, por exemplo, ou um tantinho mais longe, mas não o
suficiente para nos fazer pensar duas vezes se vale a pena o esforço de
caminhar até lá e simplesmente pegar essa coisa se essa coisa é mesmo a coisa
que estamos procurando e não outra coisa, uma que, embora não quiséssemos em
princípio, agora nos parece inexplicavelmente curiosa.
Uma coisa não muito longe da razoabilidade, portanto.
Essas perguntas embutem uma outra, mais
prioritária, se é possível matizar a ordem de prioridades na vida de uma
pessoa. Vamos a ela: o que de fato tem importância? O que importa?
A nossa crise - se há uma – é a crise da importância? É a crise de não saber o que é importante? É a crise de achar tudo importante ou o seu contrário, crer que nada é demasiadamente importante?
Quero entender se a habilidade de
distribuir uma quantidade x de importância entre as coisas (assim como os
alimentadores de lagartos num zoológico distribuem pequenos roedores como refeição)
pode de repente se perder no tempo ou é algo já assimilado pela inteligência
genética, de modo que, a despeito da paisagem cultural, continuará existindo.
Distribuir as coisas segundo o grau de
importância não é mais uma necessidade no presente contexto? A própria ideia de
importância continua tendo alguma importância?
O que mudou, a ideia que temos da ideia, a
centralidade da ideia, que permanece a mesma, ou a substância da ideia?
A intenção não é complicar as coisas, mas (1) descobrir se o hábito de acreditar que algo tem importância ainda é praticado
em larga escala; e se (2), confirmada sua atualidade, é executado nos mesmos termos
de antigamente. Caso tenha sido esquecido, se houve substituto
ou se as pessoas já não se importam tanto que não haja nada com que se importar.
É uma
ideia e tanto pensar num grupo de seres humanos que elege como princípio máximo
de vida a noção algo fluida de que não há hierarquias entre quereres.
Tudo é “querível” e, como tal, possível.