Há descompasso, que é descompasso? É desentendimento
nos quereres e poderes, assim, pluralizados, de modo que impera agora
sentimento desgovernado, dito desta maneira soa até leviano, bobo,
ridiculamente infantil, mas o fato é que há sempre descompasso entre o querer
nosso e o querer da realidade, sendo a última mais forte, incontornável e
indiferente, só nos resta colocar a viola no saco e partir – partir ao meio,
encerrando cada coisa em seu lugar, ou partir, encaminhando-se diligentemente à
porta de saída, se bem me entendem há maneiras e maneiras de cotejar o desejo,
confrontar a parede, nenhuma delas exige menos que a dor, nenhuma concede salvo-conduto,
nenhuma abre mão de uma boa briga, a todos o meu muito boa sorte.
Vista de longe, em seu desenho irregular e mortiço, a mancha parecia extravagante, extraterrestre, transplantada, algo que houvesse pousado na calada da noite ou se infiltrado nas águas caídas das nuvens, como chuva ou criatura semelhante à de um filme de ficção científica. Mas não era. Subproduto do que é secretado por meio das ligações oficiais e clandestinas que conectam banheiros ao litoral, tudo formando uma rede subterrânea por onde o que não queremos nem podemos ver, aquilo que agride os códigos de civilidade e que é vertido bueiro adentro – o rejeito dos trabalhos do corpo –, ganha em nossos encanamentos urbanos uma destinação quase mágica, no fluxo em busca de um sumidouro dentro do qual se esvaia. A matéria orgânica canalizada e despejada a céu aberto, lançada ao mar feito embarcação mal-cheirosa, ganhando forma escura no cartão-postal recém-requalificado e novamente aterrado e aterrador para banhistas, tanto pela desformosura quanto pelos riscos à saúde. Não me detenho na es