As fotos de crianças que substituem as dos adultos são um fenômeno de rede, cada usuário, assíduo ou não, adere à regra com bastante naturalidade, é uma onda, febre se considerarmos a rapidez e grau de participação das pessoas, afinal são tantos os perfis no Facecook e Twitter transformados em duto de comunicação direta com um passado glorioso, crianças loiras, morenas, gordinhas, magras, cabelos compridos, pernas tortas, o substrato do que somos hoje de repente se evidencia já nos primeiros anos de vida, o susto é inevitável, os meios como túneis do tempo, há quem peça mais que essa olhadela curiosa que todos estamos dispostos a conceder e concentre forças em aproveitar a oportunidade para fazer da alteração visual um jogo egocêntrico de perguntas e respostas, uma brincadeira de adivinhação cujo centro nervoso é a própria vida, não a minha ou a sua, mas a dele. Como fenômeno a onda das fotos de criança, que precede o Dia das Crianças e se justifica minimamente diante da curiosidade que alimentamos em relação à vida do outro, requer ainda tempo e maturidade antes de emitirmos qualquer análise, que agora soaria precipitada, sem dúvida.
Preliminarmente, todavia, cabe perguntar, o
que há por trás da face rosada das crianças no Face, como incluir nessa equação
sociológica a infantilização do mercado e a velocidade das mídias digitais, o
que pretendem ao modificarem a imagem que habitualmente exibem nas ferramentas
de interação, que resultado esperam colher ao verem se multiplicar os
comentários e curtidas?
De partida é preciso se despir dos
preconceitos e encarar o objeto sem amarras teoréticas, só assim é possível discernir
a situação e delinear respostas, tais como a excessiva energia gasta na
tentativa sempre frustrada de parecermos o que de fato gostaríamos de ser, daí,
desse patamar de busca e frustração, à crença de que um dia fomos exatamente esse
algo inalcançável, peça publicitária de um filme pessoal inserido num passado
distante, irrecuperável, evocado apenas de relance em fotografias amareladas, tão
estáticas quanto as de hoje, adultas, é um salto que pode ser facilmente
entendido e até tolerado.