O pai liga, falam-se o mais básico, interrogam-se o combinado, está de saída, comeu, que tem pela noite, e o fim de semana, comprou as frutas que aconselhei, logo vem o silêncio, o pai quer saber mais, o filho enerva-se, explica que a pilha de negócios não convém ao exíguo do tempo, deita falação, reclama o de sempre, muito trabalho, paga insuficiente, filhos crescem-lhe feito capim, prestações, depois respira fundo como a zangar-se, o pai tem saudade, é sempre assim quando telefona, já perto das 22, o filho é bom, tem certeza, o pai tem saudade, o filho responde após algum tempo preciso de desligar.
O pai tem saudade.
Numa dessas andanças pelo shopping, o anúncio saltou da fachada da loja: “museu da selfie”. As palavras destacadas nessa luminescência característica das redes, os tipos simulando uma caligrafia declinada, quase pessoal e amorosa, resultado da combinação do familiar e do estranho, um híbrido de carta e mensagem eletrônica. “Museu da selfie”, repeti mentalmente enquanto considerava pagar 20 reais por um saco de pipoca do qual já havia desistido, mas cuja imagem retornava sempre em ondas de apelo olfativo e sonoro, a repetição do gesto como parte indissociável da experiência de estar numa sala de cinema. Um museu, por natureza, alimenta-se de matéria narrativa, ou seja, trata-se de espaço instaurado a fim de que se remonte o fio da história, estabelecendo-se entre suas peças algum nexo, seja ele causal ou não. É, por assim dizer, um ato de significação que se estende a tudo que ele contém. Daí que se fale de um museu da seca, um museu do amanhã, um museu do mar, um museu da língua e por
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