Talvez não seja absolutamente necessário acostumar-se às paisagens, digo não necessário, mas natural, e isso acaba ocorrendo mesmo quando não se deseja. Penso no terreno baldio, nas casas que cercam, nas vizinhas e nos vizinhos, no choro do menino, nos pássaros e no som dos motores que cortam a avenida em direção ao centro da cidade, e penso também que nada disso integrava a paisagem de ontem e que talvez não faça parte da de amanhã, penso que logo ao chegar esse carnaval de vida estranha atiçava a gente, provocando também uma porção bem boa de tristeza.
E o curioso nasce mesmo dessa disposição contrária presente em qualquer coisa, duas forças morando o corpo, duas vontades indispondo-se em um mesmo rancho de sentimentos. Uma que quer ir, outra que deseja voltar.
Quando cheguei aqui, quis voltar imediatamente. Logo descobri: era a paisagem, essa coisa abominável que me assusta de tão desigual que é, que repele o que trouxe, condena o feito, o possuído, uma paisagem em riste, beligerante. Acontece que há o medo, o tempo, o medo e o tempo fazendo-se parceiros enquanto nada vem.
Agora, após o tempo, é como algo inteiro, sem distinção, uma continuidade do quarto e da sala, equivalência dos estados de espírito, e o outro, o que restou atrás, resta esquecido, sozinho, talvez animando o dia e a noite de outro, talvez solitário na espera de nova mirada que lhe devolva o mistério. Penso nisso ao corredor, enquanto fumo vendo as estrelas, como são minhas essas estrelas vistas daqui, tanto quanto nunca foram.
Mas o certo é que ontem, ao ver-me novamente confrontado com essa paisagem de antes, tornada comum por anos de convívio e incomum pela presença de outra, voltei a sentir aquele velho incômodo, Maria. Aquele de que lhe falei tantas vezes e para o qual jamais encontrei resposta, nem a procurei um segundo sequer, você sabe.
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