Pular para o conteúdo principal

I was there


2012: vejam, sim.

Reduzo tudo à metade. Leituras, horas gastas em frente ao PC. Sem internet, leio mais. Em compensação, passo mais tempo sentado, fumando, vendo a movimentação rasteira dos roedores que desfilam no terreno baldio. De pé, vejo-os melhor, apressados, copulando, atravessando distâncias. Parecem terroristas se escondendo de alguma força policial. Das corujas?

Quem sabe.

Reduzo tudo. Escrevo uma vez por semana. Não sei se vai dar certo. Muita coisa tem dado errado. Os dias da semana, a alimentação, as revistas, as cores do arco-íris. Sem esforço, sem esforço.

Lado B quase parado.

Voltando. 2012 é um bom filme. Muita explosão, muita correria, muito clichê. O cientista que prevê a catástrofe, o presidente – negro – que “afunda juntamente com o navio”, o tecnocrata inescrupuloso, os heróis ordinários, a dimensão humana da catástrofe, a rotina que, mesmo com o fim do mundo iminente, persiste. Está tudo lá.

O filme vale porque consegue transmitir alguma verossimilhança. Digo: porque convence. De fato, paramos para pensar: e se isso realmente estivesse acontecendo conosco? E se o mundo estiver em perigo? Muitos devem ter sentido isso, essa angústia ao ver edifícios inteiras vindo abaixo, ou cidades inteiras desaparecerem, afundarem no mar.

Eis a fórmula. 2012 faz efeito porque o final dos tempos nunca sai de moda. Quer dizer, não é uma ideia que se possa afastar assim, facilmente. Ao contrário: está cada vez mais presente.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Museu da selfie

Numa dessas andanças pelo shopping, o anúncio saltou da fachada da loja: “museu da selfie”. As palavras destacadas nessa luminescência característica das redes, os tipos simulando uma caligrafia declinada, quase pessoal e amorosa, resultado da combinação do familiar e do estranho, um híbrido de carta e mensagem eletrônica. “Museu da selfie”, repeti mentalmente enquanto considerava pagar 20 reais por um saco de pipoca do qual já havia desistido, mas cuja imagem retornava sempre em ondas de apelo olfativo e sonoro, a repetição do gesto como parte indissociável da experiência de estar numa sala de cinema. Um museu, por natureza, alimenta-se de matéria narrativa, ou seja, trata-se de espaço instaurado a fim de que se remonte o fio da história, estabelecendo-se entre suas peças algum nexo, seja ele causal ou não. É, por assim dizer, um ato de significação que se estende a tudo que ele contém. Daí que se fale de um museu da seca, um museu do amanhã, um museu do mar, um museu da língua e por

Cansaço novo

Há entre nós um cansaço novo, presente na paisagem mental e cultural remodelada e na aparente renovação de estruturas de mando. Tal como o fenômeno da violência, sempre refém desse atavismo e que toma de empréstimo a alcunha de antigamente, esse cansaço se dá pela falsa noção da coisa estudadamente ilustrada, remoçada, mas cuja natureza é a mesma de sempre. Não sei se sou claro ou se dou voltas em torno do assunto, adotando como de praxe esse vezo que obscurece mais que elucida. Mas é que tenho certo desapreço a essas coisas ditas de maneira muito grosseira, objetivas, que acabam por ferir as suscetibilidades. E elas são tantas e tão expostas, redes delicadas de gostos e desgostos que se enraízam feito juazeiro, enlaçando protegidos e protetores num quintal tão miúdo quanto o nosso, esse Siará Grande onde Iracema se banhava em Ipu de manhã e se refestelava na limpidez da lagoa de Messejana à tarde. Num salto o território da província percorrido, a pequenez de suas dimensões varridas

Conversar com fantasmas

  O álbum da família é não apenas fracassado, mas insincero e repleto de segredos. Sua falha é escondê-los mal, à vista de quem quer que se dê ao trabalho de passar os olhos por suas páginas. Nelas não há transparência nem ajustamento, mas opacidade e dissimetria, desajuste e desconcerto. Como passaporte, é um documento que não leva a qualquer lugar, servindo unicamente como esse bilhete por meio do qual tento convocar fantasmas. É, digamos, um álbum de orações para mortos – no qual os mortos e peças faltantes nos olham mais do que nós os olhamos. A quem tento chamar a falar por meio de brechas entre imagens de uma vida passada? Trata-se de um conjunto de pouco mais de 30 fotografias, algumas francamente deterioradas, descubro ao folheá-lo depois de muito tempo. Não há ordem aparente além da cronológica, impondo-se a linearidade mais vulgar, com algumas exceções – fotos que deveriam estar em uma página aparecem duas páginas depois e vice-versa, como se já não nos déssemos ao trabalho d