O resultado é que até hoje tenho dificuldade de nomear o que se passa quando, em pleno horário comercial, dou de cara com a suspensão da rotina. O susto de, às 14h27min, encontrar uma brecha no tempo, um respiro no maquinário das horas. Como se acordássemos de tarde depois de uma soneca, certos de que o relógio havia girado as 12 horas e fosse outro dia, mas ainda é quarta-feira. Ainda é o mesmo dia. E então caminhássemos pela casa estranhando uma cadeira, um programa na televisão, a voz do pai na cozinha.
Sempre me interessei por tudo que responde ao trabalho com uma lentidão própria. A identificação é automática. Acolho o deslocado e o enviesado como talvez uma mãe abraçasse o filho a quem faltasse norte, um filho cuja vida, sempre na corda bamba, ameaçasse desmoronar. Olhando pela janela da memória, vejo na distração da sala de aula o marco de um regime de extravio, de deambulação à luz do dia, de escapismo. De lá para cá, à mercê das tarefas copiadas no caderno de 12 matérias, vaguei nas quatro linhas da quadra de futebol, fiz gols, beijei as namoradas da escola, venci todos os valentões em lutas sangrentas. Em suma, fui habitante do sonho. Ia descobrindo outro tempo. O tempo meu.
Coincidência ou não, por esses dias descobri também que há grupos de pessoas preconizando a redução da velocidade em todas as esferas da vida, da alimentação ao ritmo de trabalho, das atividades físicas à educação. Desde que não vire norma, como tudo hoje em dia, estou de acordo. Sou da opinião de que a velocidade baixa, quando bem combinada aos arranques e à constância, é garantia de gozo prolongado. Façam o teste.