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Planeta ao léu



Há horas venho pensando nesse planeta perdido no espaço. O mais miserável do universo, imagino, para logo depois corrigir: há sempre alguém em situação pior, seja você um planeta ou uma cuia de chimarrão.

Um planeta-vagão esbarrando no que sobra dos cometas, também restos de outras colisões. Não possui uma única estrela a que se agarrar, enroscando seu campo gravitacional ao dela. Não tem um cinturão de asteroides a circundá-lo. Sequer uma lua para usar como brinco. É o verdadeiro Melancolia, eternamente azul e solitário. Um trem fantasma gasoso com seis vezes o tamanho de Júpiter. 

Pobre animal celeste. Destituído de sistema, satélite artificial e sondas preparadas por inteligência humana. Uma existência sem propósito mais nobre senão o de boiar no vazio pelo tempo que os deuses julgarem necessário. Um vetor a serviço da inércia. Uma materialidade arruinada. Um desperdício químico.

Há dias em que a gente se surpreende com a alma avinagrada. Uma vontade imensa de chorar. Cada vivente é mais afortunado que nós, cada amor é mais intenso que o nosso, cada vitória é mais fulgurante que a nossa. Um mundo inteiro de bem-aventurados nos cerca. E o que fazem? 

Driblam, com graça e  leveza, os obstáculos da vida. Prodígios da empatia, ainda encontram tempo para distribuir auxílio aos desgraçados. Capricham nos cuidados com a saúde. Tentamos imitá-los. Falhamos. Tentamos novamente. Tornamos a cair.

Por sorte, esse sentimento autodestrutivo costuma durar pouco. Logo nos reanimamos. Nessas horas, admito: ligo pra minha mãe. Meia hora de conversa depois, estou como novo. O pai também serve, mas é que a mãe é diferente. Outras pessoas encontram os amigos, choram, leem um bom livro, vão ao cinema, fazem sexo compulsivamente, pintam, escrevem, esmurram um saco na academia, correm, nadam, viajam. Eu telefono pra minha mãe. Tem dado certo. 

Até que a amargura passa. De repente, nos vemos reintegrados à felicidade geral, que se expressa na internet sobretudo por meio de fotos de filhotes, casais de namorados se beijando ou flagrantes poéticos de pés sobre bancos de areia na praia. Tudo faz sentido. As pessoas estão apenas felizes. Eu sou parte do todo.

Mas esse planeta, não. Esse planeta à toa no espaço não pode recorrer a nenhum desses expedientes. E ninguém será tão estúpido a ponto de afirmar que é mais ou menos feliz que ele. 

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