Desde que assumi o compromisso de escrever um
texto todo santo dia, minha vida não mudou nadinha, exceto que acordo
pensando sobre o que escrever e durmo eventualmente considerando uma besteira
que falei e sentindo o travo metálico-terroso que
a gente sente depois de falar bastante numa conversa e depois se calar.
Nessas horas escutamos o eco da nossa
própria voz dentro da cabeça, e ela nunca é aprazível. É essa sensação
esquisita e incômoda que chamo agora de gostinho de terra, não é agradável, é
ruim, pra falar a verdade, e tentamos evitá-la a todo custo, mas nem sempre
conseguimos.
Sentia isso mais forte quando era
adolescente e me reunia com amigos na esquina pra jogar conversa fora e depois
de muitas horas jogando conversa fora sobre os mais diversos assuntos, cada um
tendo falado horrores, um dispositivo soava na mente juvenil como um apito de
fábrica avisando ao proletariado que já era hora de ir pra casa.
Às vezes é exatamente assim que sinto as
coisas depois de escrever dois textos numa mesma semana, três se levar em conta
a internet, quatro se somar uma postagem pequena que faço em cima da hora antes
de ir trabalhar, ou cinco se realmente estiver com a corda toda e muito a fim
de batucar no teclado, coisa que sempre acontece se me ocorre cortar as unhas bem
rentes e tomar três xícaras de café na mesma manhã.
Vamos concordar que não me vejo
inteiramente responsável por essa superabundância, os tempos são de
responsividade excessiva, conforme li em artigo recente.
Com a redução do tempo de resposta, escrever
e sentir equivalem-se. É natural que as coisas sejam narradas à progressão dos
acontecimentos. É normal e doentio também.
É muita palavra gasta, e a própria voz ecoa
implacável, colocando em destaque os maneirismos da gente, a sintaxe, os temas. O excesso provoca um
fastio, o fastio a dúvida, a dúvida muitas vezes leva a uma constatação: não
estou fazendo isso do jeito que deveria.
O fastio é o primeiro sintoma de uma
superexposição que passa por efeito colateral da farta opção de mecanismos de
interação na internet, se existem, se podemos usá-los e vamos de fato usá-los,
não podemos classificar o abuso um traço de certo distúrbio patológico do ser
humano.
Mas logo é o dia seguinte, e como disse um
cara que li, com o novo dia que nasce se renova não apenas a luz. Entendam isso
recorrendo ao misticismo ou não, o fato é que a coisa funciona.
Desde que tomei a decisão de me impor uma
rotina de disciplina, com leitura e redação diárias, estudo e prática, teoria e
ficção, faça chuva ou sol, percebi que algumas coisas se modificaram, mas o
principal, e aqui vem a parte que realmente importa, consiste no seguinte.
Faça o que tiver que fazer, pare pra tomar
água/café, continue fazendo em seguida, novo intervalo, agora pra ligar pra sua
mãe/pai, retome a linha do trabalho, interrompa o fluxo, veja um filme ou partes
de um filme cuja força repousa na capacidade de produzir bons roteiros para
sonhos. Em seguida, durma. Dormir é garantia de qualidade de qualquer coisa.