Passávamos ao lado, as barracas como esqueletos antediluvianos, formas antigas, carcaças de animais mortos deixados para trás. Restos de teto, paredes inteiras erguidas e agora esquecidas, tufos de palhas presas umas às outras por quase nada, o reboco condenado, tudo um arranjo prestes a cair, mas ainda assim de pé, como se a permanência ali dependesse de um acerto comum e nunca da ação individual de cada parte. O solo como um chão lunar, o vento forte de setembro dobrando a vegetação, coqueiros inclinados em ângulos de 30 graus. Uma pista vazia adiante, depois uma curva e mais à frente a duna, a subida íngreme vencida aos poucos por um grupo de pessoas que foi até ali, presumo, para ver o pôr do sol. Dúzias de carros estacionados à beira do asfalto, fileiras de motos e, no alto, pequenas sombras tapando a luminosidade com a mão em aba, à espera de que desse a hora para refazerem o caminho, agora duna abaixo, controlando a força de cada pisada de modo a não desabar. O fluxo de carros tranquilo àquela hora, quase como uma dormência automotiva, cada veículo parte de outro e de outro, todos para o mesmo destino embora fossem destinos diferentes.
Numa dessas andanças pelo shopping, o anúncio saltou da fachada da loja: “museu da selfie”. As palavras destacadas nessa luminescência característica das redes, os tipos simulando uma caligrafia declinada, quase pessoal e amorosa, resultado da combinação do familiar e do estranho, um híbrido de carta e mensagem eletrônica. “Museu da selfie”, repeti mentalmente enquanto considerava pagar 20 reais por um saco de pipoca do qual já havia desistido, mas cuja imagem retornava sempre em ondas de apelo olfativo e sonoro, a repetição do gesto como parte indissociável da experiência de estar numa sala de cinema. Um museu, por natureza, alimenta-se de matéria narrativa, ou seja, trata-se de espaço instaurado a fim de que se remonte o fio da história, estabelecendo-se entre suas peças algum nexo, seja ele causal ou não. É, por assim dizer, um ato de significação que se estende a tudo que ele contém. Daí que se fale de um museu da seca, um museu do amanhã, um museu do mar, um museu da língua e por
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